quarta-feira, 21 de junho de 2017

O papa e Mussolini – David I. Kertzer

Em fevereiro de 1922, Achille Ratti é eleito papa pelos seus colegas cardeais, na décima quinta votação, e adota o nome de Pio XI. No mesmo ano em outubro, Benito Mussolini foi nomeado primeiro-ministro pelo rei Vítor Emanuel III. A igreja precisava do poder político para recuperar seus domínios e outros benefícios perdidos no século anterior durante a Unificação Italiana. Mussolini precisava da Igreja para que a população Italiana, de maioria católica, o visse como o líder a ser seguido para a pacificação do país. A história desse acordo é o tema do livro O papa e Mussolini: a conexão secreta entre Pio XI e a ascensão do fascismo na Europa, do professor de antropologia e de estudos italianos da Universidade de Brown (EUA) David Kertzer.  
Apesar das diferenças brutais entre ambos (Pio XI era erudito e devoto; Mussolini, violento e tinha aversão ao catolicismo), os interesses de ambos prevaleceram. Segundo Kertzer, “o fascismo se estabeleceu na Itália graças ao apoio do Vaticano”. Em retribuição, Mussolini restaurou todos os privilégios que a Igreja Católica tinha antes da Unificação Italiana de 1870, como a obrigatoriedade do ensino de religião nas escolas, a presença do crucifixo nas repartições públicas, isenções de impostos e até mesmo a reforma de igrejas. O Tratado de Latrão, assinado em 1929 por Pio XI e Mussolini, entre outras coisas, restitui as propriedades que a igreja tinha pedido no século anterior e cria um Estado independente dentro da cidade de Roma, o Vaticano.  
Mas enquanto conta a história desse acordo, Kertzel traça um perfil de Pio XI, um papa que tinha aversão à democracia e um verdadeiro pavor de qualquer coisa parecida com comunismo, e desmistifica alguns fatos da biografia de Mussolini. Um desses mitos é sobre a famosa Marcha sobre Roma, a manifestação fascista que teria contribuído para a ascensão de Mussolini ao poder. Sempre se falou em 300 mil fascistas bem armados praticando atos de violência contra opositores. Kertzel afirma que não passavam de 26 mil homens mal armados (alguns desarmados). O que aconteceu para que o evento alcançasse a objetivo foi a falta de vontade do rei Vítor Emanuel em combatê-los. O soberano, assim como o papa, via em Mussolini não apenas um mal menor, mas a melhor forma de combater os comunistas. 
Esse acordo dura até 1939, quando Pio XI prepara dois documentos para denunciar a aliança de Mussolini com Hitler. No entanto, o pontífice morre na véspera da leitura de um dos documentos. Só foi possível contar uma versão diferente da narrativa padrão do Vaticano sobre esses acontecimentos depois que a própria Igreja liberou, em 2006, documentos referentes ao papado de Pio XI, como também vieram a público documentos do Arquivo do Jesuítas, em Roma. A expectativa agora é que o papa Francisco libere os documentos referentes ao papado de Pio XII (1939-1958), sucessor de Pio XI, chamado por muitos de “o papa de Hitler” pelo seu silêncio com relação ao Holocausto.


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