sexta-feira, 25 de abril de 2014

O golpe, a comissão e a patrulha

Demorei para falar sobre assunto por que , na realidade, não queria falar sobre o assunto, mas sobre as manifestações que aconteceram sobre o assunto. Falo sobre os cinquenta anos do Golpe Militar de 1964. E o que vi não me surpreendeu. De um lado, a esquerda festiva se manifestando a cada esquina, celebrando os seus “heróis”, e repudiando os excessos cometidos pela ditadura. Do outro lado, os simpatizantes do Golpe se escondiam, fazendo suas manifestações em ambientes fechados para não atrair para si a ira das patrulhas ideológicas.
Falo que isso não me surpreendeu por que nunca me iludi com a suposta democracia apregoada pela esquerda, que só existe para os seus aliados. Que o diga Cuba, Venezuela e congêneres. O autoritarismo está no DNA da esquerda. Não sou a favo de nenhuma ditadura, muito menos a que foi instalada no Brasil em 1964, mas seus simpatizantes tem o direito de celebrá-la. De mais a mais, esse evento cabe algumas releituras.
A primeira dessas releituras refere-se à duração da ditadura, de 1964 a 1985. Vejo aí um equívoco! Não podemos dizer que o Brasil vivia numa ditadura de 1964 a 1968, no máximo num estado autoritário. Como poderia uma ditadura permitir os festivais de música, onde cantores de esquerda cantavam músicas “subversivas”? Como poderia uma ditadura permitir que editoras, como a Civilização Brasileira, publicassem autores “subversivos”, como Celso Furtado e Fernando Henrique Cardoso? E o Cinema Novo? E as eleições diretas para governador, ocorridas em 1967?
Podemos afirmar que vivemos uma ditadura entre 1968 e 1974. Porém, de 1974 até 1985 voltamos a viver num estado autoritário.    
Outra releitura a ser feita é sobre o espectro politico antes do Golpe. Temos que parar com o maniqueísmo segundo o qual a esquerda “boazinha” queria evitar que a direita “malvada” acabasse com a democracia no Brasil. Mentira! A esquerda era tão golpista quanto a direita. A esquerda não deu um golpe e implantou uma ditadura tão mais sangrenta por que é incompetente para isso. Mas se tivesse um mínimo de organização, teria implantado uma aberração a la Cuba no Brasil.
Como o mundo dá voltas, hoje a esquerda “boazinha” está no poder e quer apurar os crimes cometidos durante a ditadura, através de uma tal Comissão da Verdade. Se for uma apuração buscando tão somente a verdade histórica, estou de acordo. Se for uma apuração objetivando uma revanche, sou contra. E que essa tal de Comissão da Verdade apure também os crimes cometidos pelos militantes de esquerda, afinal os excessos foram cometidos de parte a parte.
Não me venham com esse papo de evocar o “direito inalienável de resistência”, segundo o qual ações violentas contra membros do aparato repressivo de um Estado ditatorial e ilegal não são violações dos direitos humanos. Se formos usar esse raciocínio, os militares também não cometeram violações dos direitos humanos, afinal estavam combatendo os membros de organizações que queriam implantar no Brasil um aparato repressivo de um Estado ditatorial e ilegal de esquerda.
É inegável que excessos existiram por parte de agentes do Estado no combate à esquerda. Mas não se pode negar que os excessos foram dos dois lados. Se a Comissão da Verdade fala tanto nos 424 mortos de militantes de esquerda, número fornecido pelo livro Dos filhos deste solo, do ex-ministro Nilmário Miranda (um número provavelmente inflado, comprovados são 293 mortos), por que não lembrar dos 120 mortos pelos grupos de esquerda, muitos deles sem nenhuma vinculação com a luta armada? Seus familiares terão direitos às reparações financeiras generosas dadas pela Comissão da Verdade?
Deixemos bem claro uma questão de princípio: não deveria ter morrido ninguém, seja de esquerda, seja de direita, muito menos inocentes perdidos entre dois lados ideologicamente insanos. Nenhuma ditadura presta, seja de direita ou de esquerda, civil ou militar. Mas não podemos semear mitos históricos ao sabor de quem estar no poder, muito menos disfarçar uma ditadura dentro de Estado democrático através de patrulhamentos ideológicos, instrumento fartamente e abusivamente utilizado pela hoje “esquerda festiva”, outrora “esquerda armada”.  

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