sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Calígula

A História é escrita pelos vencedores. Com isso, o perfil de quem perde muitas vezes é deturpado. Isso pode ter acontecido com o imperador romano Calígula (37-41). A imagem que temos hoje dele é a de um lunático, pervertido, tirano, insano, psicopata e narcisista. Vejamos algumas “proezas” de Calígula, segundo Suetônio e Cássio Dio: tinha um relacionamento amoroso com as irmãs Drusilla, Agripina e Livilla; realizava orgias com a participação compulsória das esposas dos seus auxiliares diretos; era perdulário, levando as finanças do Império à ruína, a ponto de confiscar propriedades e criar impostos sobre tudo, até a prostituição; considerava-se uma divindade, tendo um templo dedicado a ele; era um líder incompetente, tendo nomeado seu cavalo, incitatus, magistrado superior; para baratear os custos das prisões abarrotadas, executava prisioneiros (na presença dos familiares) e servia-os de ração aos demais; entre outras barbaridades.

Calígula, nos quatro anos do seu reinado, sempre buscou centralizar o poder, confrontando o Senado e a aristocracia romana. Os historiadores da época dependiam ou eram representantes do Senado, não tendo nenhum motivo para falar bem do imperador. Sem contar que Suetônio escreveu sete décadas após a morte do governante e Cássio Dio, o fez quase 200 anos depois. Portanto seus relatos se alimentaram em fontes pouco isentas. São relatos importantes, sem dúvida, mas não podem ser tomados como totalmente verdadeiros. Segundo Anthony Barret, professor de história romana na Universidade da Columbia Britânica, “Os fatos demandam análise crítica e é preciso tentar corroborá-los com evidências arqueológicas”. Não que Calígula fosse um santo. Estava longe disso. Ele cometia abusos, mas isso era uma prática corriqueira e fazia parte do jogo político da época.

A sua relação com as irmãs tem uma explicação política. Como não possuía grandes feitos militares, precisava provar ser merecedor do cargo pela linhagem que remontava Augusto. Homenageando os familiares, justificava a sua própria posição. Com relação à nomeação do seu cavalo como magistrado, também há uma explicação política. Calígula vivia em atritos com o Senado, questionado quem seria o novo Cônsul no ano seguinte (o cônsul deveria ser, necessariamente, um senador), respondeu que preferia o seu cavalo aos candidatos disponíveis. No campo administrativo, Calígula também não foi um desastre. Não há registro de crises financeiras durante o seu reinado. Sem contar outras realizações, como a construção dos aquedutos Aqua Claudia e Anio Novus; a construção de um porto para escoar grãos; a anexação da Mauritânia, marcando a dominação romana no norte da África e a construção de fortes e armazéns na atual Holanda, que serviu de preparação para a conquista da Britânia.

A imagem que ficou de Calígula é tão negativa que o filme sobre sua vida, feito em 1979 e roteirizado por Gore Vidal, um conceituado intelectual americano, teve apelos pornográficos, o que desagradou o roteirista. O filme, até bem pouco tempo, não sei agora, é considerado pornográfico. Sobre isso e para tornar o texto mais leve, aí vai uma historinha: no inicio dos anos 2000, eu dava aula no ensino médio numa escola particular e tinha um aluno que estudava teologia se preparando para ingressar no seminário e tornar-se padre. Numa aula sobre História de Roma, fiz referências ao filme, deixando claro que possuía cenas de sexo explícito. O dito aluno foi a uma locadora (na época ainda existia), reuniu seus colegas do curso de teologia, inclusive o padre, e exibiu o filme, salientando que era uma indicação do seu professor de história. Eu, no caso. No outro dia as primeiras pessoas que vi ao chegar à escola foram o padre e o diretor. Tive que dá explicações.

Um comentário:

  1. O erro foi ter deixado claro q possuía cenas de sexo explícito. Adolescente adora isso, ainda mais um quase seminarista. Adolescente e sexo é uma mistura de fácil combustão.LILI

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