domingo, 30 de maio de 2010

Amor verdadeiro

- ...?
- Não! Meritíssimo. Isso e impossível. Essa mulher é a prova da existência do demônio. Portanto , a reconciliação é impossível.
- ...?
- Vou começar do começo para o senhor entender. Quando conheci essa mulher, ela era uma mocinha jeitosa, tinha a inteligência de dançarina de programa de auditório, mas jeitosa...
- ...?
- Meritíssimo, sabe aquela história de que se todo mundo quer eu também quero? Pois é... Mas vamos em frente. De tanto insistir consegui namorá-la, mas nunca fui às vias de fato por que ela não deixava, se dizendo virgem. O primeiro problema aconteceu oito meses depois com o nascimento do primeiro filho, o Juninho...
- ...?
- Não, meritíssimo, o senhor não entendeu errado, foram oito meses para nascer o Juninho. Fiquei desconfiado, mas olhava para aquela cara de anjo e não achava que ela fosse capaz do que eu estava desconfiando. Quis acreditar que era mais um capricho da natureza. O segundo problema foi o fato de ela fazer questão de registrar o menino com o meu nome.
- ...?
- Por que? Sei não, doutor, mas acho que as adúlteras gostam desse nome que é para mostrar para todo mundo, menos para o mais interessado, que ela sabe quem é o pai da criança; ou que, pelo menos, que ela sabe quem vai registrar o menino. Para encurtar a conversa e me desculpando a expressão, Junior é nome de filho de corno!
- ...!
- Perdão meritíssimo. Mas a vida continuou. Todos os dias eu saía para trabalhar e ela ficava em casa assistindo novelas e filmes ou lendo revistas de fofocas. Pelo menos eu acreditava nisso! Uns dois anos depois do nascimento do primeiro filho, nasceu uma criança linda, uma menina. Apesar dos comentários das minhas irmãs de que a menina não tinha nada de mim, eu a amava. Se bem que elas não estavam totalmente erradas. A garota era a cara do padrinho do meu filho mais velho.
-...?
- Continuei, meritíssimo. O ser humano é um animal estranho. Quanto mais eu me sentia traído e tinha quase certeza disso, mais eu queria essa mulher. Eu só não queria que todo mundo ficasse sabendo, me apontasse na rua como corno. Ser corno tudo bem, desde que os outros, principalmente os amigos, não ficassem sabendo.
- ...?
- A saída? Eu fiz um pacto com ela: aceitaria todas as traições dela desde que eu não ficasse sabendo.
- ...?
- Para minha surpresa ela ficou indignada, ofendida até por eu fazer tão mau juízo dela. O que estava pensando eu dela? Uma vagabunda? Uma qualquer? Não! Ela era uma mulher honesta, uma mãe de família! E para provar tudo isso resolveu se converter. Se tornar a mais devota das mulheres. O grande problema era que as provas do crime, digo, do chifre, continuavam lá em casa: as crianças com a cara dos pais, sejam eles quem forem.
-...?
- Mudou por um lado. Ela parecia honesta, andava para cima e para baixo com a Bíblia debaixo do braço, pregando para quem quisesse ouvir e para quem não quisesse também. Pelo menos disfarçou os chifres...
- ...!
- É doutor, chifres. Agora eu não levava mais chifre com o padeiro, com o carteiro, com o vizinho, com o colega de trabalho, de barzinho e com quem mais aparecesse. Agora era um chifre abençoado. A partir de agora eu ia levar chifre com o pastor, o obreiro, o devoto, o segurança do Templo e quem mais aparecesse nesse ambiente santo da igreja. Só escapou Jesus Cristo por que morreu a dois mil anos e aí já era demais levar chifres até com defunto...
- ...!
- Perdão, meritíssimo, pela heresia.
-...?
- Tem volta, não, meritíssimo. Na rua todo mundo já sabe de tudo. Fica difícil para mim. Já disse pro senhor: ser corno vá lá. Desde que o povo não fique sabendo.
- ...
-Qual?
-...
-Bom, doutor, pensando melhor, acho que dá pra segurar os chifres sim. Se é pra pagar um mundo desse de dinheiro de pensão, é melhor agüentar chifre. Levar chifre de graça dói um pouquinho. Mas pagar pra levar chifre, a dor é dupla: na testa e no bolso.
-...?
- Pensando melhor eu amo essa mulher. Eu não sei viver sem ela. Mesmo por que sem ela meu dinheiro vai embora todinho com a pensão. Como vou viver? Passar bem, doutor.

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